Helenas – Parte III

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         – O terceiro encontro

Mariana manteve o intervalo de poucos dias entre as sessões; esse não era o procedimento adotado em Plantão, no entanto, em decorrência da gravidade do caso, resolveu que veria a mulata-com-pinta-no-lábio, três vezes por semana. Ela também decidiu que falaria do atendimento somente em supervisão, nada de buxixos e detalhamentos avulsos.

As suas colegas respeitaram, mas não gostaram da decisão. Os buxixos extra supervisão eram um acontecimento à parte, nos estágios de Plantão e muita coisa se ficava sabendo longe dos olhos do supervisor. Aqueles detalhes “insignificantes”, as seqüências não mencionadas em decorrência do tempo de supervisão, os sentimentos mais variados do estagiário, observações sobre roupas e higiene, as atitudes tragicômicas do paciente, tudo isso formava um delicioso universo de curiosidade e comentários.

Mariana, não comentando, mantinha a concentração e se protegia, desgatava menos. Ela decidiu entregar-se de corpo e alma ao atendimento e não queria desviar-se de seus propósitos: a cantora-plantonista sentia-se exclusiva da mulata-de-cabelos-cacheados e, definitivamente, co-habitava seu mundo, suas dores, seu processo de enlouquecimento. Para o bem e para o mal.

Na terceira sessão, o marido trouxe também uma grande sacola. Assim que Daniel saiu do consultório, ela moveu o corpo com delicadeza e a menina Helena apareceu: “eu tenho aqui, algumas de minhas bonecas, você quer que eu mostre?” “Quero, claro”. Ela então, sentou-se no meio da sala, empurrou as cadeiras mais próximas, pegou a sacola e retirou uma a uma. “Essa é a Pamela, já falei dela, é aquela que vai casar”, e colocou a boneca sentada no chão.

Assim fez com as 15 bonecas, todas lindas, com diferentes histórias de vida. Enquanto falava, ela as penteava, maquiava, ajeitava. Trocou peças de roupa, encenou encontros, determinou destinos. A estagiária também sentou no chão e acompanhou-a em seu criativo mundo de imaginação: brincaram; durante uma hora e meia, plantonista e paciente brincaram de boneca; e foram momentos muito agradáveis para Mariana, que apenas brincou, despretensiosa.

“O que pensa dela” perguntou, de súbito, a Normal. “É graciosa, encantadora, e muito carente, parece que perdeu algo antes do tempo.” “Foi a inocência, não é mesmo? Tem algo atravessado nela, uma coisa não-assimilada, como uma queda permanente.” A aprendiz olhou para Helena, o que “via”era exatamente assim. “E como é que se ameniza isso, doutora?” Perguntou aflita, enquanto olhava pela janela.

“Eu não sei.” Veio o silêncio, que durou um tempo longo. Helena fechou os olhos e respirava lentamente, então soltou uma gargalhada estridente e empurrou cadeiras de encontro à parede. Mariana deu um salto, a Louca começou a girar em torno de si mesma e fez menção de se aproximar da janela, a estagiária deu dois passos para frente. Foi então, que numa fração de segundo, a mulher de Daniel tentou bater a cabeça nas grades, a cantora-plantonista foi mais rápida segurando-a com força; travou-se novamente, o duelo entre as duas.

A Louca forçava e a futura psicóloga impedia. O cheiro de doença crônica mortal voltou, Mariana fraquejou, a paciente quase se desvencilhou, deu um tranco, mas a cantora firmou o pé direito e devolveu o tranco. Helena caiu e começou a chorar, era a Meninota. O choro veio contido, como se não pudesse mostrar que chorava; a estagiária sentou-se, puxou a paciente para si, colocou a cabeça dela em seu colo e fez-lhe cafuné. A menina-Helena chorou, chorou, chorou… até adormecer.

Mariana continuou a afagar os cabelos cacheados e longos, e ficaram assim: uma afagando e a outra dormindo. A plantonista-estagiária já percebera que o tempo, quando estavam juntas, adquiria outro ritmo. Isso ela nem mencionara em supervisão porque causaria uma perplexidade-desmedida, então, aceitava simplesmente, acatava o que o supervisor dissera. O que sentia, por exemplo, era que a condição de afago, na sala de atendimento, durou dias e dias, no entanto, ao consultar o relógio, apenas meia hora se passara.

E da Meninota foi mãe; pretendeu, através do afago, tornar a carência-queda menos dolorosa. Foi uma tentativa de resgatar a inocência através do poder da relação-de-extensão, em que uma existe a partir da outra. E como se tratava de duas mulheres, uma delas deveria possibilitar então, a existência do si-mesmo, de outra-semelhante. Nessa hora, a aprendiz “viu” em sua alma a facilidade que na maioria aparece como complicação: a necessidade-exigência de ser a única impedia o desprendimento necessário para a constituição da outra-semelhante: a extensão de uma igual dificultava as coisas e a cantora-de-bela-voz compreendeu o porquê dos famosos atritos entre mãe e filha.

A Meninota acordou e ainda permaneceu um tempo com a cabeça no colo de Mariana. O silêncio era absoluto, mas acolhedor; a respiração dela foi se tornando leve, quase imperceptível: porque nem pesava parecia um anjo dormindo. Era assim que a estagiária sentia a inocência das crianças, havia uma transparência leve, suavemente-perfumada, descomprometida, delicada: a pureza.

A paciente levantou a cabeça, a Normal reapareceu: “parece que mergulhei no poço do amor, como é bom…obrigada.” Mariana sorriu, quem deveria agradecer era ela, por aprender tanto. Despediram-se.

 

–         A seqüência

O final de semana chegou e a cantora-psicóloga quis a solidão e o silêncio. Só fazia pensar e relembrar; sentiu-se tão privilegiada, que sentiu humildade. Mariana não morria de amores pela humildade, não que fosse arrogante, mas na sua compreensão, a humildade a tornava submissa. No entanto, com a experiência da mulher-desdobrada-em-seis descobria que a sabedoria conduz à humildade e estava disposta a reaprender.

No quarto encontro, que aconteceu no início da semana, quem apareceu quase o tempo todo na sessão foi a Vítima. Mariana além de ouvir concentrou-se num tema específico: as escolhas. O que a moça-vítima deixava evidente com seu palavrório era uma atmosfera de auto-valorização pela condição de não-escolha, mas qual a função disso?

A estagiária pretendeu ultrapassar as considerações corriqueiras: mecanismo de defesa, compensação pela auto-desvalorização, etc e etc. O curioso era que essa versão, dentre todas, parecia valorizar sobremaneira seu modo de ser; nem a Ninfomaníaca trazia tamanha volúpia de aparição-exibicionista. O que há de tão especial na impossibilidade de fazer frente a condições externas? A estagiária não conseguia avançar… Então desistiu e assim que olhou pela janela, veio o famoso arrepio: Helena-louca se aproximando.

Um riso estridente ecoou alto pelo consultório. A Louca sentou diante da aprendiz e ficou a observá-la; ela mexia com a cabeça e revirava discretamente os olhos daquele jeito que somente os malucos conseguem fazer. Mariana não gostou da situação, mas não tinha alternativa: resolveu enfrentar, encarando. Ela sentiu que a Louca procurava alguma coisa em sua alma, e que se fosse normal perguntaria; então, falou para si mesma, “os loucos fazem estranhas escolhas”.

E gostou de pensar a loucura numa perspectiva de escolhas. A aluna queria muito “ver” a loucura, mas não conseguia; a intuição não vinha. “O que você quer?” Resolveu arriscar, era a primeira vez que se dirigia àquela versão. Silêncio; a paciente, no entanto, compreendera porque alterara ligeiramente as feições do rosto. O modo fixo de manter o olhar, também, característica dos malucos foi a próxima estratégia utilizada por Helena, o que começou a incomodar a estagiária, pois, tinha que fazer um esforço sobre-humano para permanecer vasculhada, aguardando.

Aquilo parecia uma disputa, pensou, de repente. Ela mede forças comigo, quer me vencer. “Não vejo problema em que vença, isso aqui não é um ringue”, falou calmamente. “Não quero apenas a derrota para você, quero que sinta a energia descomunal das escolhas sem sentido aparente”. Falou pela primeira vez, numa voz grave e fanhosa, a louca-Helena. “Eu gostaria mesmo era de ver o sentido…” retrucou Mariana. “Não pode e sabe por quê?” Silêncio. “Precisaria estar do lado de cá.” Silêncio. “O que eu, porém, lhe adianto é que não é tão ruim quanto parece”.

E riu descontroladamente, ameaçadoramente. Mariana recuou a cabeça, não queria mais. Sentiu uma “coisa” contagiante acariciando seu corpo, seus cabelos e, também, sua alma; então, prendeu a respiração, concentrou-se num único ponto do rosto de Helena, em seguida, abaixou a cabeça e gritou: “não!!!!!!!!!!!!!!!!”

A Louca assustou-se e deu vez à Meninota. Mariana levantou a cabeça respirando ofegante, a “coisa” pegajosa havia desaparecido.

 

–         A supervisão

“Você está certa em supor que a Helena-vítima obtém mais prazer na auto-exposição do que a Ninfomaníaca; a condição de não-saída, que indica a hegemonia das escolhas condicionadas, revela a impossibilidade de alteração das condições inatamente-construídas durante o primeiro estágio da existência. Imagine viver sempre assim, sabendo que não poderá alterar qualquer coisa em si mesma. Trata-se de um privilégio às avessas. Não é mesmo?”

“Eu não gostaria”. O supervisor sorriu. “Em relação à loucura, nossa paciente anuncia um aspecto contagioso. Parece que ela queria te contaminar, é isso? “Sim, professor, foi horrível”. “E ainda prometia que não seria tão desagradável.” “Huh”. “Essa questão é complexa, é melhor não entrarmos nesse mérito Mariana; no entanto, o interessante é que se pensarmos em termos de constituição de identidades, qualquer que seja a identidade em questão haverá inevitavelmente a afirmação desta em detrimento de todas as outras”.

O silêncio envolveu a todos. “Eu gostei que estivesse impedida de ‘ver’ a loucura, ‘algo’ te protegeu; melhor assim, não?” “Eu queria muito, mas em determinado momento, desisti, senti o perigo”. “As coisas estão indo muito bem, moça! Pense. Até a Maluca quis falar com você, quis conhecê-la. Parabéns, logo, logo, teremos novidade.” “Como assim, o que quer dizer?” “Que a mulata-desdobrada-em-seis está movimentando-se no sentido de retomar a integração de sua personalidade.”

A afirmação do supervisor encheu de alegria os dias de Mariana. A plantonista não acompanhou o raciocínio do mestre, mas nele acreditou. A simples idéia de que a mulher-do-lenço-colorido conseguiria reverter seu processo de enlouquecimento a fazia perder o sono. E o que dizer do modo como foi dito? Assim, publicamente, na frente de quem quisesse ouvir? A moça resplandecia e sentiu que seu corpo não comportaria tamanha satisfação. E tratou então, de preparar a alma, caso acontecesse.

É que não saberia o que fazer com a alegria desmedida, repleta, permanente. A plantonista chegou a imaginar que uma alegria como aquela poderia se estender por tempo demais e não queria. Nesta vida, queria era sentir de tudo, pelo menos quase tudo: o estado permanente de uma única emoção a assustava, a conduziria à estagnação e ao tédio. E considerou que diante da intensidade duradoura dos afetos, deveria acelerar a passagem do tempo. E mais uma coisa esquisita aconteceu: desenvolveu a habilidade de desgastar a intensidade da alegria, submetendo-a à aceleração do tempo.

A aprendiz jamais concebera tal coisa, mas, agora, sabia como fazer; bastava então, esperar que a alegria resplandecente viesse redonda, absoluta; não a temia mais.

 

         – A quinta sessão

A bela moça atravessou o grande portão, parou por alguns instantes, olhou para cima e deteve-se nos detalhes do sobrado em que a Clínica estava instalada. Depois, ajeitou os óculos escuros, avançou, empurrou a porta de vidro e disse: “boa tarde!” A sala de espera estava vazia, Beatriz levantou a cabeça e respondeu: “boa tarde, em que posso ajudá-la?”

“Eu tenho uma consulta daqui a quinze minutos com a Dr. Mariana”. E sentou-se. “Deve haver algum engano, a Mariana tem atendimento nesse horário, mas é com outra paciente”. “Não se preocupe, é comigo sim, você é que ainda não tinha me visto. Sou Helena de Sousa Ortega.” A funcionária não conseguiu esconder o assombro. “Como? A esposa do Daniel?” “Huh, eu mesma; agora consigo vir parecendo gente, não é?” E sorriu, os dentes eram imaculadamente brancos e o cabelo solto, volumoso, bem tratado, resplandecia.

“Pode aguardar, por favor.” “Obrigada.” A secretária pediu licença e dirigiu-se até a sala de alunos. “Mariana, eu não acredito. Ela veio sozinha, está lá, linda. Eu não imaginava que era tão linda.” “De quem você está falando? O que houve?” “Venha, venha comigo.” E arrastou a aluna pela mão. Deu a volta, entrou pela sala dos professores, pediu que a cantora ficasse parada em determinado lugar, abriu uma porta que ficava no canto oposto e teve acesso à sala de atendimento. Ao entrar, deixou propositalmente a porta aberta e, do lugar de onde estava, a aluna podia ver Helena sentada, folheando uma revista.

A funcionária retornou com uns papéis na mão e fechou a porta. “Viu só?” “Ela sempre me surpreende, Beatriz, sempre.” “Que coisa, hein!? Em tão pouco tempo! Parabéns!” A aluna não entendeu direito, não sentia como mérito seu aquela melhora espetacular. Saiu para a parte dos fundos da Clínica, foi respirar e deixou o sol bater em seu rosto. “Nada é permanente no atendimento dessa mulher, de turbilhão em turbilhão estamos aqui, aquecendo sob o sol”, falou baixinho e discretamente sorriu e, pela primeira vez, cantarolou: “eu sei que ainda estão rolando os dados, porque o tempo, o tempo não pára, não pára não, não pára…”

Era a primeira vez que conseguia cantarolar depois de conhecer a mulher de Daniel. Aí sim, a alegria veio como arrebentação, arrastando e misturando pedaços de alma: de uma e de outra, de Mariana e de Helena, de médica e de paciente, de mulheres possíveis, de múltiplas-mulheres-múltiplas, de vida. A plantonista conferiu as horas, passou uma água no rosto e em seguida dirigiu-se à sala de atendimento.

“Helena”, chamou com voz firme; “oi, Doutora, tudo bem?” A mulata levantou-se, estendeu a mão e foi conduzida ao consultório. Beatriz mal conseguia atender ao telefone, já vira muita coisa naquela clínica, mas uma transformação daquele calibre era de tirar o chapéu.

“Sente-se”, disse a estagiária, “como é bom vê-la assim, parabéns, mulher.” “Obrigada, mas metade disto é mérito seu; quarenta por cento meu e dez por cento do Daniel, fiz bem a divisão?” “A Normal é quem fala e parece que assumiu o comando; e as outras, o que aconteceu com as outras?” Pensou a cantora. Em sintonia, veio a resposta, “eu não sei exatamente o que aconteceu, mas sinto que a lucidez vence e as outras estão se transformando em personagens novamente.” “Helena, isso é fantástico!” “E eu não sei? Imagine a alegria do Daniel, ele queria vir aqui beijar seus pés.”

“Conte-me o que está sentindo, por favor.” “Força, segurança, alegria, certeza. Aqui dentro do peito; sabe a fênix, que pega fogo e renasce? É o que sinto. Nem tenho mais medo das outras, se quiserem vir que venham; é isso.” Respirou calmamente e continuou, “o que eu fui e sofri, está guardado de um jeito bom dentro de minha alma, não me perturbam mais; e o que pretendo fazer é construir uma nova vida, de alegria e de paz.” E falou e conversaram, e se alegraram.

A nova Helena deteve-se num assunto que anteriormente apenas compunha o cenário turbulento dos atendimentos: seus filhos. Falou de cada um, demoradamente. O que ela mais desejava era relacionar-se com os filhos de modo espontâneo, maduro, equilibrado. A bela mulata queria ser afetuosa, dedicada, inteira; e que seus conflitos não atrapalhassem a relação com as crianças. Antes, porém, havia um turbilhão que a arrastava-consumindo. “Como é possível ser boa mãe se nem mãe tive?” Perguntou com tristeza. “De onde eu poderia tirar o afeto que não me deram?” Continuou. “Como sair da ausência para a presença equilibrada?”

E falou, e se expôs, e chorou. Mariana ouvia com atenção, nada disse, nenhum comentário fez; apenas a consolava com os olhos, com o carinho que deixava exalar dos olhos. Quando a sessão já ia longe, a Menina-Helena apareceu. Apresentou-se tão singela que só cantou. A voz suave era límpida, mais afinada que das outras vezes. A aprendiz permaneceu calada e, de vez em quando, fechava os olhos deixando que a música ocupasse espaços de alma.

A quinta sessão foi assim: redenção vinda de todos os lugares, tristeza que principia a esperança, salvação da alma. Mariana, quando chegou em casa, chorou. Tanto, que pensou que nunca pararia. “Se eu tiver que morrer agora, morro satisfeita, realizada, plena.” Dizia baixinho enquanto as lágrimas escorriam calmas, cristalinas. Passou a noite a olhar, através das lágrimas, a vida autônoma e misteriosa. Compreendia tanto e nada levava, apenas a potente satisfação de auxiliar.

Naquele instante, sentiu que tinha descoberto sua vocação. Viera ao mundo para fazer o que fizera, e nada podia ser tão enriquecedor, tão espetacular. Sentiu-se privilegiada por colher bons frutos do enfrentamento com forças tão poderosas e sentiu que arriscara tudo, até a sanidade. E colheu a redenção: a possibilidade de fazer o melhor no pior, de elevar as condições da existência, de romper com elos que aprisionam e conduzem ao sofrimento resultante das inadequações.

 

         – A supervisão

Mariana relatou com fidelidade e leveza tudo o que ocorrera na quinta sessão e nas horas que se seguiram. Várias colegas choraram, e o silêncio era a única forma possível de reação àquele relato. O supervisor também permaneceu em silêncio. Se a aprendiz sentiu-se justificada e vocacionada, ele vivenciou a mesma condição elevada à décima potência. O responsável pela atuação dos estagiários de Plantão viu sua vocação de formador atingir o ponto máximo, o topo da potência transformadora: ele tanto possibilitava a redenção de um quanto ensinava o ofício a outro. Duas atividades difíceis e complexas, quase impossíveis. No final, ele falou pouco, apenas ressaltou o que Mariana destacara tão bem. Em termos da continuidade do atendimento, disse que mais duas ou três sessões seriam suficientes e que depois, a plantonista poderia acompanhá-la de quinze em quinze dias.

 

–         O término

Foi exatamente dessa forma. A sexta e a sétima sessões aconteceram apenas com a Helena-normal, que parecia renascida; não é que voltara a ser o que era, transformara-se noutra coisa, bem melhor que antes. Daniel veio e abraçou Mariana com tanta força que a moça quase chorou; ele parecia uma criança, estava radiante, e não usava o característico terno.

As duas trataram de comunicar ao psiquiatra o resultado do tratamento e Helena, na sétima sessão, trouxe os filhos para a vocalista conhecer. A mulata trouxe ainda dois presentes: uma bolsa e um lenço colorido, parecido com o que usava. A estagiária não acreditou quando tocou naquela peça, desejara tanto ter um lenço daquele. . . Sorriu.

A despedida deu-se de forma alegre. Uma jurou para a outra que jamais a esqueceria. Helena não queria vir de quinze em quinze dias, marcou para daí um mês. Mariana concordou. Abraçaram-se. A mulata disse: “obrigada, Doutora, você me salvou.” A vocalista respondeu: “obrigada Helena, você mostrou minha vocação; isso quer dizer que também me salvou.”

As duas se olharam com ternura. A mulata deu a mão aos filhos, atravessou a porta de vidro, contemplou o céu azul turquesa, atravessou o grande portão, respirou profundamente e partiu.

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